Mikhail Bakhtin e a autoridade poética
Por Cristovão Tezza
O teórico russo não se interessou apenas pela prosa, mas também pela definição da poesia
O presente texto tentará descrever o que chamo de “hipótese de Bakhtin” na definição da linguagem do discurso poético. É fato que a prosa foi o grande tema de Mikhail Bakhtin (1895-1975) -mas ele também teorizou sobre a poesia, se não extensivamente, pelo menos intensivamente em alguns momentos.
Além disso, toda a concepção de linguagem e de literatura de Bakhtin pressupõe, sempre, um lugar da poesia e um lugar da prosa, não no quadro tradicional dos gêneros composicionais, quadro esse que nunca interessou Bakhtin, mas como formas substancialmente diferenciadas de “apropriação da linguagem”. Assim, antes de entrar na questão específica da poesia, é preciso rever o conceito de prosa romanesca segundo Bakhtin -é apenas com relação a esse conceito que sua visão de poesia fará sentido.
O grande centro temático de todas as ramificações do pensamento bakhtiniano está na prosa artística, mais especificamente no romance. Em sua obra mais famosa, “Problemas da Poética de Dostoiévski”, embora o tema central seja a literatura de Dostoiévski, a discussão sobre o romance como gênero aparece em vários momentos, sempre relacionada à discussão sobre a natureza da linguagem, literária ou não, como, aliás, foi a marca de todo o trabalho de Bakhtin. Parte substancial de suas categorias se encontra neste livro, em particular o conceito de “polifonia”, que ficaria célebre pelo mundo inteiro como uma das marcas maiores do pensamento bakhtiniano.
Para Bakhtin, Dostoiévski foi o criador de um novo gênero literário, o romance polifônico, cuja característica marcante (entre outras exigências) estaria no fato de que na obra do romancista russo as vozes que ressoam no texto não se sujeitam a um narrador centralizante (como em geral acontece no romance considerado tradicional); elas relacionam-se umas às outras em “condições de