Michel Foucault
SOBRE A PRISÃO
Magazine Littéraire:
Uma das preocupações de seu livro é denunciar as lacunas dos estudos históricos. Você observa, por exemplo, que ninguém fez a história do exame. Ninguém pensou nisto, mas é impensável que ninguém tenha pensado.
Michel Foucault:Os historiadores, como os filósofos e os historiadores da literatura, estavam habituados a uma história das sumidades. Mas hoje, diferentemente dos outros, aceitam mais facilmente trabalhar sobre um material "não nobre". A emergência deste material plebeu na história já data bem de uns cinqüenta anos. Temos assim menos dificuldades em lidar com os historiadores. Você não ouvirá jamais um historiador dizer o que disse em uma revista incrível, Raison Présente, alguém, cujo nome não importa, a propósito de Buffon e de Ricardo: Foucault se ocupa apenas de medíocres.
M.L.: Quando você estuda a prisão, lamenta; ao que parece, a ausência de material, por exemplo de monografias sobre esta ou aquela prisão.
M.F.: Atualmente retoma−se muito a monografia, mas a monografia tomada menos como o estudo de um objeto particular do que como uma tentativa de fazer vir novamente à tona os pontos em que um tipo de discurso se produziu e se formou. O que seria hoje um estudo sobre uma prisão ou sobre um hospital psiquiátrico? Fez−se centenas deles no século XIX, sobretudo acerca dos hospitais, estudando−se a história das instituições, a cronologia dos diretores, etc. Hoje, fazer a história monográfica de um hospital consistiria em fazer emergir o arquivo deste hospital no movimento mesmo de sua formação, como um discurso se constituindo e se confundindo com o movimento mesmo do hospital, com as instituições, alterando−as, reformando−as. Tentar−se−ia reconstituir a imbricação do discurso no processo, na história. Um pouco na linha do que Faye fez com relação ao discurso totalitário. A constituição de um corpus coloca um problema para minhas pesquisas, mas um problema sem dúvida diferente do da pesquisa lingüística,