MARXISMO E DEMOCRACIA
Ivo Tonet
Introdução
O tema, assim colocado pelo título, é por demais vasto. Faz-se necessária uma delimitação. Falar em marxismo pode dar a idéia de que exista uma doutrina homogênea e coerente com esse nome. O que, de fato, existe, é uma tradição marxista, complexa e contraditória, onde se entrecruzam variadas interpretações do pensamento de Marx. Com posições, às vezes, muito conflitantes e excludentes. Mas, todas elas se reportando ao pensamento do fundador dessa tradição.
De modo que falar em marxismo e democracia num sentido tão amplo seria abordar a história dessas variadas interpretações do pensamento de Marx e dos que se pretendem seguidores dele acerca dessa problemática. O que, obviamente, não é realizável em tão pouco espaço nem seríamos nós competentes para tal empreitada.
Por isso, preferimos ater-nos apenas ao que julgamos seja o pensamento de Marx a respeito dessa questão. E mesmo assim, sabendo que circunstâncias histórias determinadas levaram a colocar essa questão, a nosso ver, de modo equivocado. Vale dizer, a discussão, em geral, começa por colocar a questão dessa forma: Marx é contra ou a favor da democracia? É claro que, colocada assim a questão, não é difícil, ao examinar a obra dele, encontrar argumentos para sustentar qualquer uma das duas posições. Especialmente, a primeira.
Entendemos que o caminho deve ser diferente. O ponto de partida não deve ser o exame dos textos onde Marx se refere explicitamente à questão da democracia. Infelizmente, é isso o que costuma acontecer, com o conseqüente descaminho de toda a problemática. A nosso ver, o ponto de partida deve ser o estabelecimento da natureza do pensamento de Marx, a sua arquitetura fundamental para, em seguida, compreender aquela problemática a partir desse fio condutor. Isto porque, o sentido de qualquer questão (no caso, da democracia) só aparecerá efetivamente quando ela for remetida à arquitetura do conjunto da obra desse autor.