Machado de Assis
DE MACHADO DE ASSIS
Gilson Motta
Resumo -Com base nas teorias de Nietzsche e de Schopenhauer sobre o trágico e em alguns conceitos da filosofia existencialista, este estudo aborda o conto O espelho: esboço de uma teoria sobre a alma humana, de Machado de Assis, discutindo o tema da consciência trágica como elemento fundamental do pensamento moderno.
Palavras-chave– Consciência trágica. Alteridade. Machado de Assis. Sujeito moderno.
Introdução: A Filosofia e o Trágico: Verdade e Ilusão
O trágico é um conceito que articula necessariamente a teoria filosófica e a ficção, seja pelo fato do conceito ligar-se à tragédia, enquanto gênero literário-teatral, seja pelo fato do próprio gênero conter temas que, desde Platão até Nietzsche, alimentam a reflexão filosófica. Neste movimento que vai do primeiro ao último filósofo, o trágico de deslocou da esfera da ficção e, conseqüentemente, da falsidade, para a esfera da vida, da realidade, afirmando-se como ausência de fundamento. Essa caracterização do trágico é uma criação da Modernidade, na medida mesmo em que esta produziu a experiência da negatividade radical. Se, em sua essência, a Filosofia é uma afirmação do fundamento, da unidade que sustenta e dá sentido à realidade, é justo na Modernidade que a existência e o mundo atravessam uma crise dos fundamentos, um processo de diluição dos valores, chamado de Niilismo. A consciência trágica é fruto da compreensão da inutilidade dos valores e da ausência de substância e de sentido para o real, acrescida à necessidade de determinação. Este conflito de valores condiciona o trágico. Assim, a tragédia problematiza a própria estrutura da agência humana, confrontando a estrutura subjetiva e a estrutura objetiva da realidade, enquanto fatores determinantes da escolha-decisão. Este problema, capital nas tragédias grega, clássica e elisabetana, também se apresenta na arte e literatura modernas. O trágico deixa de pertencer à tragédia