Leitura comparativa -os lusíadas e mensagem
Os Lusíadas e Mensagem
D. Sebastião – da esperança camoniana à utopia pessoana
Os poemas de Camões e de Fernando Pessoa sobre Portugal situam-se respectivamente, no início e na fase terminal do longo processo de dissolução do império. Daí notáveis diferenças, a par de afinidades sensíveis. [...] Tanto Camões como Pessoa, cantores da pátria, são poetas da ausência. Poetas do que foi ou do que poderá vir a ser. Dum amor que ou se refugia na memória ou, revigorado, se traduz na vibração dum apelo. Mas as situações divergem, um intervalo multissecular tinha de separá-los. No Camões épico predomina o elemento viril – a viagem, a aventura, o risco. Tradicionalmente, a mulher é a que fica, esperando, imóvel, na felicidade e no sonho do regresso: como Pessoa e as figuras em que se desdobra, de olhos fitos no indefinido. Homem de acção, e não só de inteligência, Camões ainda conheceu o império no concreto da sua grandeza e das suas misérias, era-lhe fácil ainda ter esperança, o D. Sebastião a quem se dirige é um jovem de carne e osso, vale a pena mostrar-se, exibir os seus préstimos, para que o Rei o distinga, confie nele, se lance na conquista do Norte de África levando-o consigo. Outro império terreno ainda parece possível, "como a pressaga mente vaticina", o próprio Velho do Restelo sanciona a aventura, e Camões prepara-se para cantar a nova empresa. O D. Sebastião da Mensagem, elaborado longamente pelo sebastianismo e pela humilhação, esse é o Encoberto, o Desejado, uma sombra, um mito. Pessoa sobrevive na aridez dos «dias vácuos», já lhe faltam razões para acreditar, o seu desejo está no limite, calcinado pela espera de quatro séculos. Refaz o trajecto camoniano da evocação para a invocação. Mas, perante o Rei ausente, que talvez nunca mais regresse da sua ilha encantada, é como se fosse o menino órfão, abandonado, que, na desolação da sua própria intimidade, dirige à mãe uma derradeira súplica: «Screvo meu Livro à beira-