Latour Antropologia Do Centro Entrevista
ENTREVISTA
POR UMA ANTROPOLOGIA DO CENTRO
Bruno Latour
Esta entrevista foi realizada em Paris, em fevereiro de 2004, no gabinete de Bruno
Latour na École Nationale Supérieure des
Mines, por Renato Sztutman e Stelio
Marras. A École des Mines oferece, tradicionalmente, cursos em geofísica, engenharia de materiais e energia, robótica, matemática, economia industrial, mecânica, reatores. Ali, Latour ensina sociologia, no quadro da formação oferecida pelo
“Centre de sociologie de l’innovation”, mas parece preferir não ser tomado por um sociólogo. Sua formação é em filosofia, embora ele não se diga filósofo.
Epistemólogo seria, ainda talvez, uma designação mais justa. Se bem que ele não recusaria de todo o rótulo de historiador das ciências. Ele próprio se define como um
“sujeito híbrido”. Visto como um antropólogo, Latour seria um antropólogo da modernidade — mais especificamente, um antropólogo da ciência ou da natureza.
Como ciência humana das coisas, esta antropologia da natureza não adere, contudo, seja ao realismo das ciências naturais, seja ao construtivismo das humanidades.
Latour situa sua perspectiva nem de um lado, nem de outro, mas no meio — no centro, precisamente onde ocorre seu objeto de estudo por excelência, os híbridos ou matters of concern, isto é, as coisas ao mesmo tempo naturais e domesticadas, os quase-sujeitos e quase-objetos dotados simultaneamente de objetividade e paixão.
E é também no centro do Ocidente e de
seus coletivos modernos que se processa a produção e proliferação desses híbridos, em paralelo à prática, tipicamente moderna, de sua purificação. É por isso que os laboratórios de alta tecnologia, por exemplo, são lugares privilegiados de investigação etnográfica para uma antropologia das ciências, coração de uma antropologia da modernidade. Metodologicamente, trata-se de seguir as coisas através das redes em que elas se transportam, descrevê-las em seus enredos — é preciso estudá-las não a partir dos pólos da