Jose murilo de carvalho
Lea Guimarães Souki*
Introdução
O tema da cidadania já é bastante estudado no Brasil, no entanto, em muitas circunstâncias, não é abordado com a devida clareza, na medida em que o conceito mescla-se com a atividade política. O que aqui se pretende enfatizar são pressupostos que, sob o meu ponto de vista, estão contidos no trabalho de
T. H. Marshall e que poderiam ser objeto de debate no estudo da cidadania no
Brasil. Trata-se, especialmente, de explorar uma possível presença de uma espécie de rationale das classes dominantes em relação à tolerância acerca da desigualdade no caso inglês. Haveria implícito no trabalho de Marshall o esboço de um projeto de nação das classes dominantes inglesas em relação à quantidade de desigualdade compatível com o que concebem como vida civilizada?
O trajeto a ser seguido na argumentação é o seguinte. Em primeiro lugar, um esclarecimento sobre os conteúdos, empíricos e normativos que delineiam o conceito de cidadania no Brasil. Em segundo lugar, a consideração de um dos
* Doutora em Sociologia Política pela UnB, professora titular no PPG em Ciências Sociais na
PUC-MG; áreas de pesquisa: cidadania, metrópole. Mail: leaguim@terra.com.br.
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Porto Alegre
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aspectos teóricos mais relevantes considerados por T. H. Marshall, a saber, a tensão existente no próprio conceito entre os princípios de direitos iguais e a desigualdade contida na ordem capitalista. Finalmente, coloca-se a questão se se pode inferir, no caso do Brasil, a inexistência, do ponto de vista das classes dominantes, de um cálculo ou até mesmo de uma preocupação sobre o quanto de desigualdade seria tolerável como parte da construção da nação.
O conceito e a atividade política
Para realçar os aspectos que considero relevantes, inicio a discussão