Interpretação como ato de conhecimento e interpretação como ato de vontade:
A TESE KELSENIANA DA INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA
Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira(
INTRODUÇÃO
Este ensaio tem por objetivo realizar um estudo sobre as reflexões em torno da problemática da interpretação jurídica desenvolvidas por aquele que, sem dúvida, foi sem dúvida um dos juristas de maior importância para o Direito no século XX: Hans Kelsen. Nenhum jurista teve, nos últimos cem anos, maior destaque do que ele. Há como discordar de Kelsen, mas não há como desconhecê-lo. A expressão "interpretação autêntica" não está presente na primeira edição da Teoria Pura do Direito, nem em um esquecido texto de Kelsen sobre a interpretação, publicado no princípio da década de 30, na Internationale Zeitschrift für Theorie des Rechts[1]. Ela passa a ser usada na edição em língua francesa do mesmo livro que, como o próprio Kelsen diz, em seu prefácio, não é uma simples tradução, mas um aperfeiçoamento da obra[2]. No capítulo dez, sobre a interpretação, Kelsen faz alguns aditamentos e modificações importantes no sentido de esclarecer o seu ponto de vista. Mas é na edição de 1960 da Teoria Pura do Direito que o capítulo, agora oitavo, vai surgir totalmente reestruturado e com grandes alterações. Essas alterações, como veremos, são bem mais do que formais, pois (1) o conceito de interpretação autêntica vai sofrer um alargamento que, em última análise, (2) terá posto em evidência toda a insustentabilidade dos pressupostos teóricos de Kelsen, inclusive perante o paradigma do Estado Democrático de Direito, (3) sem falar na ameaça à própria coerência interna de sua teoria. Os textos objeto de estudo serão, principalmente, os das edições de 1934, de 1953 e de 1960 da Teoria Pura do Direito[3].
1 – O DESENVOLVIMENTO DA TESE DA INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA
1.1 – A Primeira Edição da Teoria Pura do Direito (1934) Nesta edição, em que Kelsen