homem,cultura e sociedade
Tradução e notas de Guilio Davide Leoni
SERENO A SÊNECA271F1 I — 1. Observando-me atentamente, descobri em mim, ó Sêneca, certos defeitos tão visíveis que eu os poderia tocar com o dedo; outros que se dissimulam nas regiões mais profundas; outros, enfim, que não são contínuos, mas que reaparecem somente a intervalos. Eu não hesito em dizer que estes últimos são os mais desagradáveis de todos. Eles lembram aqueles inimigos que nos rodeiam para nos assaltar no momento propício e com os quais não se sabe nunca se se deve estar em pé de guerra, ou se se pode contar em um período de paz. 2. No entanto, a disposição na qual eu me surpreendo o mais freqüentemente (pois, por que não me confessarei a ti, como a um médico?) é de não estar nem francamente liberto de minhas crenças e repugnâncias de outrora, nem novamente sob seu domínio. Se o estado no qual estou não é o pior que possa existir, é, em todo caso, o mais lamentável e o mais bizarro: não estou nem doente nem são. 3. Não me digas que todas as virtudes são fracas nos seus inícios e que com o tempo elas tomam consistência e força. Também não ignoro que todos os benefícios que visam ao exterior, como o brilho de uma dignidade, a glória da 1 Sêneca imagina que o amigo Aneu Sereno (do qual bem pouco conhecemos: a ele o filósofo dedicou três obras — A Perseverança do Sábio, Da Tranqüilidade da Alma, 0 Lazer — para convertê-lo do epicurismo ao estoicismo) lhe apresente algumas perguntas. Na verdade, Sêneca não responde exatamente às perguntas e dúvidas do amigo, mas de modo geral estas páginas se colocam entre as mais brilhantes e vivazes do escritor romano." eloqüência e todos aqueles que dependem do favor público, têm necessidade de duração para crescerem: as virtudes precisam de tempo para amadurecer, e as qualidades que nos permitem seduzir graças a um simples verniz esperam que o correr dos anos lhes