Ha no firmamento
É constituído por 4 quadras, muito curtas e sintéticas - no que é uma das marcas inconfundíveis da obra ortónima de Pessoa. Há no firmamento
Um frio lunar.
Um vento nevoento
Vem de ver o mar.
Quase maresia
A hora interroga,
E uma angústia fria
Indistinta voga.
Não sei o que faça,
Não sei o que penso,
O frio não passa
E o tédio é imenso.
Não tenho sentido,
Alma ou intenção...
Estou no meu olvido...
Dorme, coração...
Os elementos exteriores são: o firmamento (o céu), o frio lunar e um vento (quase nevoeiro, porque vem do mar, misturado com a maresia). O exterior contrapõe-se ao interior, pelo que há que analisar estes elementos exteriores face aos sentimentos que eles provocam no sujeito poético. O firmamento pode simbolizar simultaneamente a distância e o inalcansável. O frio lunar pode simbolizar a paragem do tempo, a impossibilidade de se viver a vida e de, ao mesmo tempo, reflectirmos sobre ela. O vento-nevoeiro, é afinal o obstáculo entre a vida presente (e triste) e uma outra vida distante (e feliz). Tudo isto é subjectivo, mas é claro que há uma identificação entre a angústia do poeta que escreve e o mundo que ele vê, provavelmente olhando pela janela à noite. No meio do poema há um momento de transição que é preciso destacar: "E uma angústia fria / Indistinta voga". Note-se que a angústia é "fria", como a maresia que vem do mar e o frio lunar que permeia o firmamento.
O estado de espírito do poeta ao escrever este poema pode caracterizar-se como angustiado, perdido, sem esperança nem sentido. Afinal o que ele sente é o que ele vê, como se as suas sensações exteriores fossem exactamente iguais às suas sensações interiores - embora na realidade pareça ser o contrário; afinal outros olhos poderiam sentir outras coisas, ao ver exactamente as mesmas imagens exteriores. Há aqui várias marcas do heterónimo, nomeadamente: a identidade perdida, a