gregório de matos
Um branco muito encolhido,
Um mulato muito ousado,
Um branco todo coitado,
Um canaz todo atrevido;
O saber muito abatido,
A ignorância e ignorante
Muito ufana e mui farfante,
Sem pena ou contradição:
Milagres do Brasil são.
Quem um cão revestido em padre,
Por culpa da Santa Sé,
Seja tão ousado que
Contra um branco honrado ladre;
E que esta ousadia quadre
Ao bispo, ao governador,
Ao cortesão, ao senhor,
Tendo naus no maranhão:
Milagres do Brasil são.
Se este tal podengo asneiro
O pai o esvanece já,
A mãe lhe lembro que está
Roendo em um tamoeiro:
Que importa um branco cueiro,
Se o... É tão denegrido!
Mas se nomisto sentido
Se lhe esconde a negridão,
Milagres do Brasil são.
Prega o perro frandulário,
E como a licença o cega,
Cuida que em púlpito prega,
E ladra num campanário:
Vão ouvi-lo de ordinário
Tios e tias do Congo,
E se, suando o mondongo,
Eles só gabo lhe dão,
Milagres do Brasil são.
Que há de pregar o cachorro,
Sendo uma vil criatura,
Que não sabe de escritura
Mais que aquela o pôs forro?
Quem lhe dá ajuda e socorro
São quatro sermões antigos;
E se amigos tem um cão,
Milagres do Brasil são.
Um cão é o timbre maior
Da Ordem predicatória,
Mas não acho em toda a história
Que um cão fosse pregador,
Se nunca falta um senhor:
Que lhe alcance esta licença
De Lourenço por Lourença,
Que as pardas tudo farão,
Milagres do Brasil são.
Té em versos quer dar penada,
E por que o gênio desbroche,
Como é cão, a troche-moche
Mete a unha e dá dentada:
O Perro não sabe nada,
E se com pouca vergonha
Tudo abate, é porque sonha
Que sabe alguma questão,
Milagres do Brasil são.
Do Perro afirmam doutores
Que fez uma apologia
Ao Mestre da teologia,
Se da lua aos resplendores
Outra ao sol dos pregadores:
Late um cão a noite inteira,
E ela, seguindo a carreira,
Luz com mais ostentação,
Milagres do Brasil são.
Que vos