Georges Canguilhem - O que é a Psicologia
O QUE É A PSICOLOGIA?
(conferência ministrada em 1956 e editada em 1958)
George Canguilhem (1904-1995)
(tradução de Maria da Glória Ribeiro da Silva)
(notas críticas de Monah Winograd)
A questão “Que é a psicologia?” parece mais perturbadora para o psicólogo do que é, para o filósofo, a questão “Que é a filosofia?”. Porque, para a filosofia, a questão de seu sentido e de sua essência a constitui, bem mais do que define uma resposta a esta questão. O fato de que a questão renasça incessantemente, na falta de uma resposta satisfatória, é, para quem gostaria de poder se chamar filósofo, uma razão de humildade e não uma causa de humilhação. Mas, para a psicologia, a questão de sua essência, ou mais modestamente de seu conceito, coloca em questão também a própria existência do psicólogo, na medida em que, por não poder responder exatamente sobre o que é, tornou-se bastante difícil para ele responder sobre o que faz. Ele não pode, então, procurar, senão numa eficácia sempre discutível, a justificação de sua importância de especialista, importância que não desagradaria absolutamente a alguns que ela originasse no filósofo um complexo de inferioridade.
Ao dizer da eficácia do psicólogo que ela é discutível, não se quer dizer que ela é ilusória; quer-se simplesmente observar que esta eficácia está sem dúvida mal fundada, enquanto não se fizer prova de que ela é devida à aplicação de uma ciência, isto é, enquanto o estatuto da psicologia não estiver fixado de tal maneira que se deva considerá-la como mais e melhor do que um empirismo1 composto, literariamente codificado para fins de ensinamento. De fato, de muitos trabalhos de psicologia, se tem a impressão de que misturam a uma filosofia sem rigor uma ética sem exigência e uma medicina sem controle. Filosofia sem rigor, porque eclética sob pretexto de objetividade; ética sem exigência, porque associando experiências etológicas2 elas próprias sem crítica, a do confessor, do educador, do chefe, do