Geilza
Prefácio
Em outubro de 1930 ocorreu-me a aventura do exílio. Levou-me primeiro à Bahia; depois a Portugal, com escala pela África. O tipo de viagem ideal para os estudos e as preocupações que este ensaio reflete.
Em Portugal foi surpreender-me em fevereiro de 1931 o convite da Universidade de Stanford para ser um dos seus visiting professors na primavera do mesmo ano. Deixei com saudade Lisboa, onde desta vez pudera familiarizar-me, em alguns meses de lazer, com a Biblioteca Nacional, com as coleções do Museu Etnológico, com sabores novos de vinho-do-porto, de bacalhau, de doces de freiras. Juntando-se a isto o gosto de rever Sintra e os Estoris e o de abraçar amigos ilustres. Um deles, João Lúcio de Azevedo, mestre admirável.
Igual oportunidade tivera na Bahia - minha velha conhecida, mas só de visitas rápidas. Demorando-me em Salvador pude conhecer com todo o vagar não só as coleções do Museu Afrobaiano Nina Rodrigues e a arte do trajo das negras quituteiras e a decoração dos seus bolos e tabuleiros como certos encantos mais íntimos da cozinha e da doçaria baiana que escapam aos simples turistas. Certos gestos mais finos da velha cozinha das casas-grandes que fez dos fornos, dos fogões e dos tabuleiros de bolo da Bahia seu último e Deus queira que invencível reduto. Deixo aqui meus agradecimentos às famílias Calmon, Freire de Carvalho, Costa Pinto; também ao professor Bernardino de Sousa, do Instituto Histórico, a Frei Filoteu, superior do Convento dos Franciscanos, e à preta Maria Inácia, que me prestou interessantes esclarecimentos sobre o trajo das baianas e a decoração dos tabuleiros. "Une cuisine et une politesse! Oui, les deux signes de vieille civilisation...", lembro-me de ter aprendido num livro francês. É justamente a melhor lembrança que conservo da Bahia: a da sua polidez e a da sua cozinha. Duas expressões de civilização patriarcal que lá se sentem hoje como em nenhuma outra parte do Brasil. Foi a Bahia que nos deu alguns