Falar fácil
Paula Silveira 2008
Que grande “seca”!
Assistir a um congresso, a um debate, a uma entrevista ou a uma reunião de trabalho pode ser uma experiência traumática para o comum dos mortais. E porquê? Porque, na grande maioria dos casos, técnicos, políticos e dirigentes esmeram-se em expor as suas ideias através de uma linguagem hermética, difícil e absolutamente incompreensível para todos os que não sejam da sua área. Por outro lado, ainda, falam durante um tempo interminável, ocupando o “tempo de antena” num discurso longo, repetitivo e cansativo. Resultado, a maioria dos ouvintes desmobiliza, o desinteresse é geral, as ideias em presença perdem-se. Os mais velhos adormecem, os jovens abandonam. O sentimento geral é “Que grande seca!”. Mas não são só as consequências negativas na paciência dos ouvintes que são importantes. Mais importante ainda é que a ideia não passou, o projecto ficou obscuro, escondido pela verborreia, enredado na confusão dos argumentos e no comprimento das frases. E se a ideia não passou, se o projecto não foi compreendido, é impossível construir a adesão social a esse mesmo projecto. Os indivíduos e grupos ficam impossibilitados de reflectir sobre ele, e terão apenas três alternativas: • • • formar a sua opinião a partir de migalhas que conseguiram captar, formar a sua opinião a partir de migalhas que alguém divulgou, ignorar o projecto, pois não conseguiram formar opinião.
Esta é uma situação propícia a toda a espécie de manipulação, política, técnica ou outras. A reflexão colectiva sobre o projecto não se faz, apenas se fixam pormenores díspares à volta dos pontos mais evidentes e evidenciados.
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Em vez do sistema social se mobilizar para a inteligência colectiva e, através dela, conseguir implementar o projecto devidamente digerido pelos indivíduos e grupos, o que se obtém é uma apatia colectiva, periodicamente avivada por episódios de pretensas