Etica de Espinosa
Spinoza rejeita e refuta as explicações do mundo com base no finalismo ou no idealismo, em todas as suas versões medievais, modernas e contemporâneas. As causas finais não passam de ficções, projeções antropomórficas sobre a realidade. Sequer as ações humanas explicam-se por causas finais, mas tão-somente pelas causas eficientes que articulam as coisas singulares. Não há plano divino, decretos de providência, sistema moral, ordem supra-real, nenhum modelo de dever-ser que possa ser aplicado sobre o plano do ser — que é o plano de imanência absoluta. Mais do que um engodo teórico ou artigo de fé, o mundo das causas finais — grego, cristão, iluminista ou constitucionalista — é um instrumento para submeter o homem à obediência e ao controle, tentando provar-lhe que é menos livre do que pode ser e, assim, querendo que seja menos homem do que é.
Se Goethe propõe que nos tornemos o que somos, o finalismo pretende que deixemos de ser. A lei moral é um dever. Nada daí pode ser conhecido. A obediência é o seu único objetivo. O dever-ser e suas tábuas não ensinam nada, senão o respeito à autoridade que os enuncia e os interpreta. Diversa da moral, a ética propugna por um modus vivendi: a ética spinozana uma vida da potência. Ademais, na pior das hipóteses, a lei moral interdita o verdadeiro conhecimento, porque o sabe nocivo à manutenção da ordem autoritária. O plano das causas eficientes de Spinoza não pode ser o da moral, da culpa, da punição, das leis; mas sim o plano do apetite e do desejo. Se os finalismos dizem que é preciso ter menos apetites e reprimir os desejos, isto é, ser menos homem, numa vida casta de moderações e privações, para que se possa um dia chegar a Deus (ao Bem, ao Justo, ao Belo); a filosofia spinozana declara o contrário: quanto mais homem se é, quanto mais apetites desenvolvermos, quanto mais conseguirmos combinar nosso desejo com aqueles que nos convêm, então mais divinos seremos. A ontologia da liberdade livra-nos do Deus