ETERNO 3 A TEORIA DE WILLIANS FOI QUEBRADA K
Vive dentro de mim uma cabocla velha de mau-olhado, acocorada ao pé do borralho, olhando pra o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço...
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo...
Vive dentro de mim a lavadeira do Rio Vermelho,
Seu cheiro gostoso d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa, pedra de anil.
Sua coroa verde de são-caetano.
Vive dentro de mim a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.
Vive dentro de mim a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda, desabusada, sem preconceitos, de casca-grossa, de chinelinha, e filharada.
Vive dentro de mim a mulher roceira.
– Enxerto da terra, meio casmurra.
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos.
Seus vinte netos.
Vive dentro de mim a mulher da vida.
Minha irmãzinha... tão desprezada, tão murmurada...
Fingindo alegre seu triste fado.
Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida – a vida mera das obscuras. (Cora Coralina)
Significado da obra
A poeta quis dizer, literariamente, poeticamente, que todas as mulheres viviam dentro dela. Ela carregava toda a humanidade dentro de si, a cabocla velha, a lavadeira, a cozinheira, a mulher do povo, a roceira, a prostituta... Belo e verdadeiro retrato do ser humano. Todos temos a humanidade dentro de nós.
BIOGRAFIA Cora Coralina
Cora Coralina , pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, (Cidade de Goiás, 20 de agosto de 1889 — Goiânia, 10 de abril de 1985), é a grande poetisa do Estado de Goiás. Em 1903 já escrevia poemas sobre seu cotidiano, tendo criado, juntamente com duas amigas, em 1908, o jornal de poemas