estatuto
Por Yurij Castelfranchi
Na sede do Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo do Campo (SP) há um pequeno quadro pendurado numa parede. Uma moldura simples. Dentro, um pedaço de papel rasgado, com manchas marrons. O pedaço de papel é uma cartilha sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. As manchas marrons são sangue. “O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) havia nascido há pouco tempo”, explica Marco Antônio da Silva, (“Marquinhos”, para todos os meninos e as meninas do projeto), coordenador geral em São Bernardo do Campo e Guarulhos e conselheiro do Movimento Nacional Meninos e Meninas de Rua. “Havia um menino, que tinha participado com a gente de todo o processo para incentivar a implementação estadual do ECA. Organizamos algumas oficinas para explicar o que estava na lei, sua importância, para meninos e meninas conhecerem seus direitos e se defenderem na rua, na escola, da polícia. Saindo de um desses encontros, o menino foi para rua. Abordado por policiais militares, foi revistado. Ele mostrou para os agentes o Estatuto. Bateram a cabeça dele no chão e na parede”. “Seu direito é este”, gritou um policial, esfregando a cartilha no rosto ensangüentado do menino. Um ano e meio depois, ele apareceu morto, boiando numa represa. Os assassinos nunca foram presos.
Aquele papel manchado de sangue é a metáfora trágica da dificuldade, no Brasil, de incorporar socialmente o respeito pelos direitos das crianças e dos adolescentes. Por que é tão difícil aplicar o princípio, aparentemente óbvio, de que a criança é um cidadão sujeito de direito e que merece proteção integral?
De “menor em situação irregular” a sujeito de direito: a revolução do ECA
“O Estatuto da Criança e do Adolescente foi aprovado no Brasil em 1990, no contexto de uma nova proposta mundial que visava enquadrar crianças e adolescentes como sujeitos de direito”, explica Débora Ramirez, advogada e professora