Entrevista De C
Brasiliense, 1984. p. 7-10.
Prefácio
Agora, o senhor chega e pergunta: “Ciço, o que que é educação?” Tá certo. Tá bom. O que que eu penso, eu digo. Então veja, o senhor fala: “Educação”. Daí eu falo:
“Educação”. A palavra é a mesma, não é? A pronúncia, eu quero dizer. É uma só:
“Educação”. Mas então eu pergunto pro senhor:’“É a mesma coisa? É do mesmo que a gente fala quando diz essa palavra?” Aí eu digo: “Não”. Eu digo pro senhor desse jeito:
“Não, não é”. Eu penso que não.
Educação... quando o senhor chega e diz “educação”, vem do seu mundo, o mesmo, um outro. Quando eu sou quem fala vem dum outro lugar, de um outro mundo.
Vem dum fundo de oco que é o lugar da vida dum pobre, como tem gente que diz.
Comparação, no seu essa palavra vem junto com quê? Com escola, não vem? Com aquele professor fino, de roupa boa, estudado; livro novo, bom, caderno, caneta, tudo muito separado, cada coisa do seu jeito, como deve ser. Um estudo que cresce e que vai muito longe de um saberzinho só de alfabeto, uma conta aqui e outra ali. Do seu mundo vem um estudo de escola que muda gente em doutor. É fato? Penso que é, mas eu penso de longe, porque eu nunca vi isso por aqui.
Então, quando o senhor vem e fala a pronúncia “educação”, na sua educação tem disso. Quando o senhor fala a palavra conforme eu sei pronunciar também, ela vem misturada no pensamento com isso tudo; recursos que no seu mundo tem. Uma coisa assim como aquilo que a gente conversava outro dia, lembra? Dos evangelhos:
“Semente que caiu na terra boa e deu fruto bom”.
Quando eu falo o pensamento vem dum outro mundo. Um que pode até ser vizinho do seu, vizinho assim, de confrontante, mas não é o mesmo. A escolinha cainão-cai ali num canto da roça, a professorinha dali mesmo, os recursos tudo como é o resto da regra de pobre. Estudo? Um ano, dois, nem três. Comigo não foi nem três.
Então eu digo “educação” e penso “enxada”, o que foi pra mim.