Enrique
O tema do outro, da diferença, dos elementos que podem dissolver ou questionar a identidade dos indivíduos, agentes ou grupos constituídos, é central no debate teórico e filosófico atual. Esta é uma categoria-chave da critica que o grande campo intelectual "pós-moderno", inspirado em Nietzche e Heidegger, utilizaram para colocar em xeque toda pretensão da razão à universalidade. Foucault, Derrida, Deleuze, Vattimo ou Rorty acusam a razão de intrinsecamente totalitária, inclusive na versão emancipatória que o movimento socialista herdou do iluminismo, negando a possibilidade até mesmo de um verdadeiro diálogo entre os diferentes.
Mas a figura do outro, da relação de alteridade presente em tantos aspectos do mundo da vida, está cada vez mais no centro da reflexão de outra corrente de pensamento: daquela que se reclama dos propósitos libertários do iluminismo ao mesmo tempo que critica o otimismo fácil do universalismo racionalista abstrato. É neste campo que se situa a obra de Enrique Dussel.
Para ao filósofo e teólogo argentino-mexicano, a modernidade tem um conceito emancipador racional que deve ser defendido. Mas também cria, desenvolve e oculta um "mito irracional" de justificação da violência sobre os diferentes, que deve ser negado e superado. Em 1492: o encobrimento do outro, Dussel procura desvendar exatamente o nascimento deste mito sacrifical irracional que é inseparável da constituição da própria modernidade e que sempre fez dos latino-americanos vítimas da modernização capitalista.
As oito conferências que o autor proferiu em Frankfurt por ocasião do quinto centenário da chegada de Colombo ao nosso continente analisam as conseqüências da passagem da Europa Ocidental, até então periferia do mundo muçulmano, à condição de centro de um mundo que teria não apenas a América, mas logo também a Índia e a Ásia sob seu domínio. A consciência do novo lugar da Europa no mundo desenvolveu-se no confronto com o seu outro, quando