Educação
Oswaldo Giacoia Junior
Departamento de Filosofia
IFCH/Unicamp
giacoia@tsp.com.br
“ ‘Eu sou corpo e alma’ – assim fala a criança. E por que não se deveria falar como as crianças?” Essas são algumas das primeiras palavras com que Zaratustra apostrofa os desprezadores do corpo. De acordo com elas, conceber a própria identidade como união substancial de alma e corpo é uma ingenuidade, uma espécie de brincadeira de crianças.
E, como tal, não há razão para se lhe atribuir demasiada gravidade: afinal, que mal há em se falar como crianças, por que se deveria proibir de faze-lo? Tanto mais quanto a isso nos inclina um irresistível poder de sedução exercido por um hábito ancestral!
Nessa passagem, surpreendemos em plena ação um procedimento tipicamente nietzscheano: o emprego daquela ironia cortante, maldosa, que produz um distanciamento crítico em relação aos mais bem guardados artigos de fé da metafísica dogmática. Ao emprega-lo, Nietzsche expõe ao ridículo aquela pomposa seriedade, característica dogmatismo filosófico de todos os tempos, deixando aparecer suas posições de princípio numa espécie nudez vulnerável: “Dito seriamente, há bons motivos de esperança de que todo dogmatizar em filosofia – não importa os modos de definitiva e derradeira instância que tenha tomado – possa ter sido, no entanto, apenas uma nobre brincadeira e coisa de principiantes, e talvez esteja muito próximo o tempo em que se compreenderá o que propriamente já terá sido suficiente para fornecer a pedra fundamental para tais sublimes e incondicionais construções filosóficas.”
Como se sabe, uma dessas pedras fundamentais foi lançada por Descartes como inconcussum fundamentum para a construção do edifício do saber moderno.
Precisamente com seu dualismo substancial da res cogitans e da res extensa, ou seja, com a descoberta da unidade simples do ‘eu penso’, Descartes instaurava primeira certeza indubitável da filosofia moderna, superando, com