Dois olhares: horror e encantamento no ato fotográfico
HORROR E ENCANTAMENTO NO ATO FOTOGRÁFICO
Filipe Feijó
RESUMO
O presente trabalho visa compreender as relações estabelecias por Phillipe Dubois entre a fotografia e os mitos de Narciso e Medusa. Em seguida, serão apresentados dois fotógrafos (Joel-Peter Witkin e Asger Carlsen, respectivamente) cujo trabalho dialoga com essas duas mitologias, mas em épocas e de maneiras diferentes. O intuito do artigo é problematizar a fotografia em nossos dias, mas situando-a numa linhagem estética e de pensamento.
“O espelho, são muitos”
Guimarães Rosa
O terrível doppelgänger
Ao olharmos no espelho, cremos que estamos vendo a nós mesmos. Se nos afirmassem que é a outro que vemos, sentiríamos horror pela identidade e não pela forma desconhecida. Quem é esse que vejo, então, senão eu mesmo? Como Pode ser outro este que me acostumei a crer que era eu? Esse novo eu, esse outro, tem qualquer coisa de inerte, vazio, como um corpo sem vida ou uma estátua de cera do Museu Tusseau. Como lidar com o outro quando o outro sou eu? “Jê est um autre” (eu é um outro), disse Rimbaud adiantando-se. Mas nem todos se sentiriam tão à vontade para exprimir tamanha ousadia no campo da alteridade. Notemos que a história da literatura e do cinema oferece fartos exemplos desse estranhamento causado pela duplicata humana, e não apenas a duplicata do espelho. No William Wilson de Edgar Allan Poe, um sujeito, o tal William Wilson, é perseguido em vários momentos da vida por um sósia homônimo que, porventura, acabou nascendo no mesmo dia do protagonista. Num duelo de espadas Wilson tira a vida do mascarado sósia e, contemplando-o agora sem mascara e percebendo-o absolutamente igual, entende que, ao matá-lo, condenara a si mesmo à morte. No filme O estudante de praga (1913), precursor do expressionismo alemão, o jovem Balduin faz um pacto de contornos fáusticos com o mago Scapinelli, no intuito de obter poder para conquistar sua amada, a