Direito
1. Os limites metodológicos da hermenêutica tradicional
Até meados do século XX, as discussões da hermenêutica jurídica não se envolveram com as da hermenêutica filosófica. A hermenêutica jurídica seguiu seu caminho dogmático e metodológico, desenvolvendo um discurso positivista que culminou no peculiar sincretismo que moldou o senso comum dos juristas no século XX: uma base formalista e sistemática, ligeiramente temperada com argumentos teleológicos. Esse é um discurso que se tornou especialmente sedutor na medida em que ele ofereceu aos juristas uma linguagem na qual eles podiam enxergar a própria prática e falar sobre ela de modo transparente. Essa me parece ser a grande virtude dos discursos de Ferrara e Maximiliano, que oferecem um mosaico pouco coeso e categorias pouco precisas, porém todas elas dotadas de um alto grau de simplicidade. No fundo, eles não oferecem uma metodologia interpretativa, mas apenas algumas categorias básicas e alguns topoi capazes de organizar o discurso de aplicação do direito.
O que os move é uma vontade de sistema, expressada pelo próprio Maximiliano quando afirma que ele buscava sistematizar os processos aplicáveis à determinação do sentido e do alcance das normas[1]. Porém, o que eles oferecem não é uma metodologia interpretativa impessoal e objetiva, mas o esforço de mapear os debates hermenêuticos de sua época e oferecer uma orientação adequada para o discurso prático. Ao tratar do elemento teleológico, por exemplo, Maximiliano afirma que “o hermeneuta usa, mas não abusa da sua liberdade ampla de interpretar os textos; adapta os mesmos aos fins não previstos, porém compatíveis com os termos das regras positivas”[2]. Que significa isso? Uso e abuso são noções vagas, usadas de modo impreciso, e que organizam um discurso tópico. Não se trata de um método científico impessoal, mas de uma organização do discurso dogmático, que se orienta pela virtude prática