Direito
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A interpretação dos fatos no direito
Eduardo R. Rabenhorst*
RESUMO. O principal escopo do presente artigo é mostrar, tomando por base a proposta formulada pelo filósofo francês Paul Ricoeur, que a interpretação jurídica não pode ser reduzida apenas aos momentos de compreensão de um texto legal e de sua aplicação aos concretos, mas que ela exige um terceiro momento, a saber, o da interpretação dos fatos. Palavras-chave: Interpretação; Interpretação dos Fatos; Hermenêutica.
1 – Introdução O título deste ensaio parece conter uma dupla contradição. Com efeito, se um “fato” é aquilo que se constitui como um dado observável da experiência, portanto, como algo indiscutível em virtude de sua própria objetividade, de que forma ele seria passível de uma interpretação? Por outro lado, ao falarmos de interpretação dos fatos no direito não estaríamos introduzindo uma contradição suplementar? Não aprendemos todos, filósofos e juristas, a distinguir as questões de direito das questões de fato, entendendo que apenas as primeiras são objeto de uma atividade interpretativa? Colocarei minhas cartas sobre a mesa de imediato: não estou pretendendo abalar as nossas crenças e convicções mais profundas nas vicissitudes da dogmática jurídica. Pretendo, o que não constitui grande originalidade, questionar a idéia de que direito é interpretação apenas porque os operadores do direito necessitam estabelecer o sentido e o alcance de normas jurídicas contidas em textos gerais e abstratos antes de aplicá-las aos casos concretos. Procurarei defender, apoiando-me principalmente nos argumentos indicados por Paul Ricoeur, que a interpretação jurídica não pode ser reduzida apenas aos momentos de compreensão de um texto legal e de sua aplicação, mas que ela exige um terceiro momento, a saber, o da interpretação dos fatos. 2 – Mudando nossa posição-padrão acerca dos “fatos”. Não estou questionando aqui a função heurística da cesura entre o factual e o