Didática
Macunaíma era a história de um brasileiro que foi comido pelo Brasil,
Macunaíma é o herói derrotado, que acaba comido pela Iara, abandonado e traído. Sua trajetória, desde o nascimento até a morte, com todas as reviravoltas, é um caminho da terra para a terra. Ele come terra no princípio e no fim do filme, mas na verdade a terra é que termina por comê-lo.
A antropofagia é uma forma de consumo que os subdesenvolvidos usaram de maneira exemplar. Os índios brasileiros, notadamente, logo ao serem descobertos pelos nossos primeiros colonizadores, tiveram a felicidade de escolher o bispo português D. Pero Fernandes Sardinha, para comê-lo em ato memorável. Não foi a toa portanto que os modernista s de 22 dataram o seu manifesto antropófago: ano 374 da deglutição do Bispo Sardinha.
Todo consumo é redutível, em última análise, ao canibalismo. As relações de trabalho, como as relações entre as pessoas, as relações sociais, políticas e econômicas, são ainda basicamente antropofágicas. Quem pode come o outro, por interposto produto ou diretamente, como nas relações sexuais. A antropofagia se institucionaliza e se disfarça. Os novos heróis, à procura da consciência coletiva, partem para devorar quem nos devora, mas são fracos ainda.
"Macunaíma" é um encontro latino-americano, o descobrimento de fronteiras ideológicas mais amplas. É um filme que encontra a América Latina em todos os sentidos, em uma busca nacional. Baseado em lendas indígenas, descobrimos que seus heróis coincidiam com a história e a realidade não só brasileira como de toda América Latina, uma síntese que não tinha nada a ver com uma cultura falsa, importada. As lendas contêm uma mesma verdade... O gigante comedor do homens, por exemplo, não é uma representação simbólica, é um típico industrial brasileiro... Outra coisa importante: a representação da antropofagia. Vemos que as coisas não mudaram