Deus
Noutro escrito, quando se tratou da delicada questão da saúde mental dos trabalhadores[3], ousou-se consignar, ainda que meramente en passant, algo de um antigo incômodo acadêmico: a insistente conotação desagradável que se atribui à palavra “trabalho” e sua frequente correlação com o texto bíblico.
No particular, entendemos que se há invocação doutrinária da Sagrada Escritura, então autorizado está, cientificamente, o aprofundamento de reflexões conducentes à genuína exegese bíblica.
Eis o objetivo deste breve arrazoado: partindo do contexto bíblico, lançar um pouco mais de luz à questão, de modo a demonstrar a incorreção dessa recorrente assertiva doutrinária no sentido de que a Bíblia convalidaria esse tal traço negativo a respeito da origem e do sentido do trabalho humano.
O TRAÇO INSISTENTEMENTE NEGATIVO DA PALAVRA “TRABALHO” E SUA VENTILADA LIGAÇÃO AO (CON)TEXTO BÍBLICO
Verdadeiramente, constitui “lugar comum” nas lições juslaborais a afirmativa de que o trabalho, na perspectiva bíblica, constitui um sacrifício. Que o trabalho, em si, é esforço, é dor. Nessa linha, geralmente se invoca um preceito bíblico dizendo que o trabalho envolve aquilo que alcançamos do suor do próprio rosto. Segue a passagem sempre citada: “No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela fostes formado; porque tu és pó e ao pó tornarás” (Bíblia Sagrada, Gênesis 3.19[4]).
Reside nessa visão um acentuado sentido de enfado, canseira. Percebe-se, pois, envolto na palavra “trabalho”, um insistente traço de desagradabilidade, como se lhe fosse algo verdadeiramente imanente e intrínseco.
É bem de ver que tal conotação fica mesmo reforçada quando nos deparamos com os estudos etimológicos que cercam a palavra “trabalho”. Veja-se que o termo grego pónos, que significa trabalho, porta a mesma raiz da palavra latina poena. Para muitos, porém, a origem do termo “trabalho” tem a ver com tripaliare, em alusão ao tripalium, instrumento de três pontas