Critica heteronormativa ao filme Azul é a cor mais quente
Por Fernando Pardal
“Azul é a cor mais quente” nos comove com um apelo fácil, nos tocando em dramas individuais que todos vivemos. Quem nunca sofreu por amor? Quem nunca errou e perdeu um grande amor? Quem nunca se arrependeu de algo que fez, tomou um fora? Suas cenas longas, com tomadas bonitas que focam pequenos detalhes da vida, dos corpos, dos gestos, criam uma identidade com a protagonista, com o difícil trajeto de descoberta da sua sexualidade, o enfrentamento que ela assume aos poucos contra o preconceito, tanto o que está do lado de fora em seus colegas, amigos, família, como o que a sociedade entranhou desde pequena em sua própria cabeça. Uma jovem colegial que procura se “forçar” a uma heterossexualidade antes que consiga assumir para si mesmo que não é ali que irá se realizar sentimentalmente, e o trajeto de assumir sua homossexualidade através de uma grande paixão, uma mulher mais jovem e madura que irá lhe ensinar a ser ela mesma, a não ter vergonha de si e de sua forma de amar.
É um filme bonito, sensível, mas sua beleza acaba aí. E, no entanto, há muito mais por trás desta beleza; por trás de uma comovente história de um amor frustrado, o filme carrega o pesado ranço do patriarcado transmitindo seu modelo para uma relação amorosa, mesmo quando nela não há um homem. A heteronormatividade em nossa sociedade é um fruto direto da forma como o sistema capitalista de exploração se baseia – entre tantas outras formas de explorar – numa opressão muito mais antiga do que ele próprio, que é o machismo e o patriarcado, para fazer recair em uma metade da humanidade o fardo mais pesado da exploração. Nossa sociedade toma como célula econômica fundamental da vida a família, na qual cabe ao homem provedor o papel de garantir o sustento da mulher e dos filhos. À mulher, a quem cabe o papel de fazer todo o trabalho doméstico não remunerado pelos capitalistas, mas fundamental para a reprodução do