Contos Gauchescos
Eu tropeava, nesse tempo. Duma feita que viajava de escoteiro, com a guaiaca empanzinada de onças de ouro, vim varar aqui neste mesmo passo, por me ficar mais perto da estância da
Coronilha, onde devia pousar.
Parece que foi ontem!... Era por fevereiro; eu vinha abombado da troteada.
Olhe, ali, na restinga, à sombra daquela mesma reboleira de mato, que está nos vendo, na beira do passo, desencilhei; e estendido nos pelegos, a cabeça no lombilho, com o chapéu sobre os olhos, fiz uma sesteada morruda.
Despertando, ouvindo o ruído manso da água tão limpa e tão fresca rolando sobre o pedregulho, tive ganas de me banhar; até para quebrar a lombeira… e fui-me à água que nem capincho!
Debaixo da barranca havia um fundão onde mergulhei umas quantas vezes; e sempre puxei umas braçadas, poucas, porque não tinha cancha para um bom nado.
E solito e no silêncio, tornei a vestir-me, encilhei o zaino e montei.
Daquela vereda andei como três léguas, chegando à estância cedo ainda, obra assim de braça e meia de sol.
Ah!…esqueci de dizer-lhe que andava comigo um cachorrinho brasino, um cusco mui esperto e boa vigia. Era das crianças, mas às vezes dava-me para acompanhar-me, e depois de sair a porteira, nem por nada fazia cara-volta, a não ser comigo. E nas viagens dormia sempre ao meu lado, sobre a ponta da carona, na cabeceira dos arreios.
Por sinal que uma noite...
Mas isto é outra cousa; vamos ao caso.
Durante a troteada bem reparei que volta e meia o cusco parava-se na estrada e latia e corria pra trás, e olhava-me, olhava-me, e latia de novo e troteava um pouco sobre o rastro; — parecia que o bichinho estava me chamando!... Mas como eu ia, ele tornava a alcançar-me, para dai a pouco recomeçar. Pois, amigo! Não lhe conto nada! Quando botei o pé em terra na ramada da estância, ao tempo que dava as — boas-tardes! — ao dono da casa, agüentei um tirão seco no coração... não senti na cintura o peso da guaiaca!
Tinha perdido trezentas onças de ouro que levava,