CONSTITUIC A O
E EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO
CAMBIÁRIO
1. INTRODUÇÃO
No estudo da teoria geral dos atos cambiários, deve-se eleger um dos títulos de crédito para servir de referência. E o mais apropriado, para essa finalidade, é a letra de câmbio, cuja estrutura possibilita o exame de todos os aspectos relevantes dos atos de constituição e exigibilidade do crédito cambial. É esta a melhor alternativa, sob o ponto de vista didático, para o desenvolvimento da matéria (todos os autores, aliás, a adotam: cf., por exemplo, Bulgarelli, 1979b). A opção apresenta apenas um inconveniente: no Brasil, quase não existe a letra de câmbio. Como o direito brasileiro criou um título de crédito mais operacional — a duplicata mercantil —, a letra de câmbio deixou de ser utilizada pelos comerciantes, e, hoje, é até mesmo proibida a sua emissão, na compra e venda mercantil e na prestação de serviços. O estudo do direito cambiário fica, assim, forçosamente um tanto defasado com a realidade, porque se inicia por — e se detém no detalhamento de — um título de pouquíssima utilização, mas que serve, melhor que qualquer outro, à completa apresentação dos institutos jurídico-cambiários.
A origem histórica da letra de câmbio situa-se na península itálica, durante a Idade Média. Como se sabe, o sistema europeu de organização política, naquele tempo, era o feudal, caracterizado pela descentralização do poder — o estado central e forte é criação da Era Moderna. Sendo o poder espalhado e pontual, cada feudo ou burgo possuía, sob o domínio de um nobre, sua organização política relativamente autônoma, o que, via de regra, se traduzia na adoção de uma moeda própria. Os comerciantes necessitavam, assim, de um instrumento que possibilitasse a troca de diferentes moedas, quando, com o intuito de realizar negócios, deslocavam-se de um lugar para outro. Criou-se, então, a seguinte sistemática: o banqueiro recebia, em depósito, as moedas com circulação no burgo de seu estabelecimento, e escrevia uma carta ao