Comunicação
Rubem Alves
Meu amigo Amilcar Herrera é um homem sábio. Isso é surpreendente, considerando-se que ele é um cientista. O fato é que ciência e sabedoria são coisas muito diferentes. Ciência é conhecimento do mundo. Sabedoria é conhecimento da vida. A exuberância do conhecimento científico vai, frequentemente, lado a lado com uma total penúria de sabedoria. Nisso o conhecimento científico pode ficar parecido com aquela praga conhecida pelo nome de “erva-de-passarinho”, uma parasita terrível que se aloja nos troncos das árvores e, à medida que cresce, a árvore morre. Estou cansado de ver Ph.D.s tolos.
Uma das características das palavras do sábio é que elas sempre nos surpreendem. Guimarães Rosa cita um intrigante aforismo que diz assim: “Aquilo que vou saber sem saber eu já sabia.” Pois é justamente isso que o sábio faz. A gente já sabia. Mas não sabia. Sabia sem palavras. Aí o sábio abre a boca e a gente se surpreende por ouvir dito aquilo que já morava adormecido no silêncio do corpo.
O Amilcar falou e eu me surpreendi. Ele me disse:
Rubem, eu tenho um sonho. Sonho que um dia qualquer eu vou acordar e vou ter esquecido o meu nome. Quem sou eu? – eu vou me perguntar. E eu não saberei o que responder. Não terei memória do meu nome. O ruim é quando a gente esquece o nome mas os outros continuam a saber quem somos. Aí os psiquiatras dizem que tivemos um ataque de amnésia. E tratam de nos curar, de fazer-nos lembrar o nome para que saibamos quem somos. O nome é uma gaiola onde o que somos mora. Declaram-nos curados quando o nosso ser aparece de novo dentro da gaiola. Bom seria se os outros também se esquecessem do nome da gente. Aí eles teriam perdido a memória da gaiola que prendia o nosso ser. E o nosso ser se transformaria em pássaro, e voaria livre por espaços por onde nunca haveria voado. O nome é prisão.
É preciso confessar que não foram essas, precisamente, as palavras do Amilcar. Faz muito