Combate as dorgas
No combate às drogas ilícitas, vamos de mal a bem pior. Até quando insistiremos nesse autoengano policialesco-repressivo-ridículo que corrompe a sociedade e abarrota as cadeias do País?
Faço essa observação, leitor, porque será votado na Câmara um projeto de lei que endurece ainda mais as penas impostas a usuários e traficantes.
Em primeiro lugar, não sejamos ingênuos; a linha que separa essas duas categorias é para lá de nebulosa: quem usa, trafica. O universitário de família privilegiada compra droga só para ele? O menino da periferia resiste à tentação de vender uma parcela da encomenda para diminuir o custo de sua parte? Como amealha recursos o craqueiro da sarjeta, que tem por princípio não roubar nem pedir esmola?
Nas ruas, quem decide como enquadrar o portador de droga apanhado em flagrante é o policial. Entre o universitário branco de boas posses e o mulato do Capão Redondo, você consegue adivinhar quem irá preso como traficante?
Embora considerada tolerante, a legislação vigente desde 2006 agravou a situação das cadeias. Naquele ano, foram presas, por tráfico, 47 mil pessoas que correspondiam a 14% do total de presos no país. Em 2010, esse número saltou para 106 mil, ou 21% do total.
O projeto a ser votado propõe várias ações controversas, para dizer o mínimo.
Entre elas, a ênfase descabida na internação compulsória, enquanto os estudos mostram que o acompanhamento ambulatorial é a estratégia mais importante para a reinserção familiar e social dos dependentes. Isolá-los só se justifica nos casos extremos em que existe risco de morte.
O projeto propõe uma classificação surrealista das drogas de acordo com sua capacidade de causar dependência, segundo a qual alguém surpreendido com crack seria condenado à pena mais longa do que se carregasse maconha. No passado, os americanos adotaram lei semelhante, que condenava o vendedor de crack a passar mais tempo na cadeia do que o traficante de cocaína em pó. As contestações