CASA DE BONECAS
O começo de “Casa de bonecas”, a peça mais famosa de Henrik Ibsen, mostra um casal aparentemente feliz. É véspera de Natal e os dois estão preparando a casa para a celebração.
O marido trata a mulher de “minha cotovia”, ela está contente porque ele foi nomeado para um cargo novo e vai ganhar mais, ambos comemoram que a vida deles, e dos três filhos, passará a ser mais fácil.
Claro que, sendo um drama, tudo mudará. O mais curioso, porém, é que você vai descobrir que os fatos revelados durante a peça na verdade, acima de tudo, mostram que a felicidade já não estava presente nesse comecinho de cena.
O enredo é simples: Nora, a esposa, tem um segredo. O marido dela, Torvald, anos antes, teve um problema de saúde grave. Precisava sair da gelada Noruega para sobreviver. Ela fingiu ter conseguido dinheiro do pai dela para isso, mas na verdade tomou um empréstimo e economizou (inclusive fazendo trabalhos para fora) para pagar o débito.
No decorrer da peça, isso vem à tona. E é um escândalo. O marido jamais aceitaria ter dependido dela. E eis o problema: o fato de ele tratá-la o tempo todo como “cotoviazinha”, no fundo, queria dizer que ele não a via como uma pessoa completa, capaz de conversar, de ajudar a resolver problemas etc.
Claro que, para nós, um século e meio depois (a peça é de 1879), tudo parece um pouco estranho. Seria natural que ela ajudasse. Mas foi justamente para que isso se tornasse natural que Ibsen escreveu a peça… Na época, foi um choque.
Ibsen conheceu uma mulher que havia passado exatamente por esse problema. No final, na vida real, o marido abandonou-a: não podia conviver com uma mentirosa… Na peça, o final é diferente, mais triunfante para as mulheres.
A peça fez imenso sucesso, correu a Europa e ajudou a causa do nascente feminismo.
A peça também tem méritos em si mesmos, artísticos. Um deles, que também passa despercebido por nós hoje, é o fato de ser um drama em prosa.
Curiosamente, até a metade do