Cartas chilenas
PRIMEIRAS ESTÓRIAS
Texto integral
AD&A Multimedia, 2011
Primeiras Estórias - Guimarães Rosa
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1 As margens da alegria I Esta é a estória. Ia um menino, com os tios, passar dias no lugar onde se construía a grande cidade. Era uma viagem inventada no feliz; para ele, produzia-se em caso de sonho. Saíam ainda com o escuro, o ar fino de cheiros desconhecidos. A mãe e o pai vinham trazê-lo ao aeroporto. A tia e o tio tomavam conta dele, justínhamente. Sorria-se, saudavase, todos se ouviam e falavam. O avião era da companhia, especial, de quatro lugares. Respondiamlhe a todas as perguntas, até o piloto 'conversou com ele. O vôo ia ser pouco mais de duas horas. O menino fremla no acorçôo, alegre de se rir para
si, confortavelzinho, com um jei to de folha a cair. A vida podia às vezes ralar numa verdade extraordinária. Mesmo o afivelarem-lhe o cinto de segurança virava forte afago, de proteção, e logo novo senso de esperança: ao não-sabido, ao mais. Assim um crescer e desconter-se - certo como o ato de respirar - o de fugir para o espaço em branco. O menino. E as coisas vinham docemente de repente, seguindo harmonia prévia, benfazeja, em movimentos concordantes: as satisfações antes da consciência das necessidades. Davam- lhe balas, chicles, à escolha. Solicito de bem-humorado, o tio ensinava-lhe como eta recllnável o assento bastando a gente premer
Primeiras Estórias - Guimarães Rosa
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manivela. Seu lugar era o da janelinha, para o amável mundo. Entregavam-lhe revistas, de folhear, quantas quisesse, até um mapa, nele mostravam os pontos em que ora e ora se estava, por cima de onde. O menino deixava-as, fartamente, sobre os joelhos, e espiava: as nuvens de amontoada amabilidade, o azul de só ar, aquela claridade à larga, o chão plano em visão cartográfica, repartido de roças e campos, o verde que se ia a amarelos e vermelhos e a pardo e a verde; e, além, baixa, a montanha. Se homens, meninos, cavalos e bois - assim