Carta do Matuto ( para fins didáticos)
Recife, 25 de janeiro de 2000.
Compadre Mané Cazuza,
Como você tem passado? Escrevo a primeira carta, depois que vim para a rua, para mandar minha notícia e desejo saber das suas.
Compadre, primeiramente eu rogo à Virgem Maria para que essa carta o encontre em paz com toda a sua família.
Quanto a mim compadre velho, a saudade me faz guerra. Maldita hora que eu vendi o meu pedaço de terra. Vim morar na capital iludido e da besteira que fiz já estou arrependido.
Aqui na cidade, o leite tem que ser comprado. Danado é que é um tal de leite desnatado que, aqui pra nós meu compadre, não tem cheiro de gado.
Compadre, eu vendi a terra, a terra que me criava quando eu cortava o terreno. Em resposta ela me dava arroz, farinha, feijão, o milho, a batata, a fava, e hoje, para escapar, sou obrigado a comprar tudo o que ela me doava.
A terra me dava a lenha para fazer carvão. Na cidade, se eu quiser cozinhar o meu feijão, compro pelos olhos da cara um tal de gás de bujão. A terra me dava flor, que enfeitava a serra e o monte. A terra me dava água que eu apanhava na fonte, aqui na cidade a água é cara e escassa, tem água dois ou três dias, depois falta dois ou três. Falta água, mas não falta a conta no fim do mês. Na terra eu criava a vaca bem mansinha que me dava o leite puro e gostoso, que de manhã eu tirava.
Lá no mato a luz é ruim, é de gás, é quase morta. Na cidade a luz é boa, a nossa vida é confortável. Danado é o papel que o homem bota debaixo da porta.
Eu sou servente de pedreiro, só ganho salário-mínimo. Por enquanto, estou morando aqui na casa de um primo, pois na casa que eu morava, lá na rua do Agave, não paguei o aluguel e o homem pediu a chave. Como eu podia pagar o aluguel no fim do mês se era mais de 200 reais e eu ganho pouco mais de 300? E o dinheiro da feira? E o vestido da mulher? E a escola dos meninos? Eu já não falo em café, que é pela hora da morte. E o dinheiro do transporte, que eu não posso andar a pé?
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