Capitulo
49. continuidade da legislação lusa
A conquista da independência política não levou o Brasil a rejeitar em bloco a legislação lusitana, cuja continuidade foi assegurada pelo decreto de 20 de outubro de 1823, em tudo que não contrariasse a soberania nacional e o regime brasileiro. Assim, o país herdava de Portugal as normas processuais contidas nas Ordenações Filipinas e em algumas leis extravagantes posteriores.
As Ordenações Filipinas, promulgadas por Felipe I em 1603, foram grandes codificações portuguesas, precedidas pelas Ordenações
Manuelinas (1521) e pelas Afonsinas (1456), cujas fontes principais foram o direito romano e o direito canônico, além das leis gerais elaboradas desde o reinado de Afonso II, de concordatas celebradas entre reis de Portugal e autoridades eclesiásticas, das Sete Partidas de Castela, de antigos costumes nacionais e dos foros locais.
Em seu L. III, as Ordenações Filipinas disciplinaram o processo civil, dominado pelo princípio dispositivo e movimentado apenas pelo impulso das partes, cujo procedimento, em forma escrita, se desenrolava através de fases rigidamente distintas. O processo criminal, juntamente com o próprio direito penal, era regulado pelo tenebroso L. V das
Ordenações, que admitia o tormento, a tortura, as mutilações, as marcas de fogo, os açoites, o degredo e outras práticas desumanas e irracionais, manifestamente incompatíveis com o grau de civilização já então atingido no Brasil, várias décadas depois da publicação da humanitária obra mestra de Beccaria.
Diante desse panorama, justificava-se plenamente a primeira e a maior preocupação com o direito penal e o processo penal. A Constituição de 1824 não somente estabeleceu alguns cânones fundamentais sobre a matéria, como a proibição de prender e conservar alguém preso sem prévia culpa formada (art. 179, §§ 8º, 9º e 10º) e a abolição imediata dos açoites, da tortura, da