Café, coco e política
Não adianta você me oferecer o grão de café que estava no cocô de não sei que bicho. Um dos cafés mais raros, mais requintados, mais exóticos do mundo. O meu preferido sempre será o da minha mãe, com o grão da feira – ou outro qualquer, de preço mediano, comprado no supermercado –, coado no filtro de papel e em geral com açúcar. Ele me traz memórias boas e está intimamente relacionado às minhas crenças. Apresenta “valor agregado”, como diriam os administradores de empresa.
Para eu achar que um grão especial – transformado num expresso elaborado, servido em xícara pré-aquecida – possa superar o café da minha mãe, eu tenho de ter disposição para isso, mudar a “chavinha” do cérebro. Ou seja, tenho de assumir que memórias e valores sentimentais não estão no mesmo patamar de características técnicas e procedimentos metódicos. Não estão nem abaixo nem acima. São esferas diferentes, que podem até se complementar, mas não se justificam (uma não pode explicar a outra).
Tal como acontece na relação entre o grão do cocô e o café da minha mãe, as convicções políticas, em geral, contornam números, dados, opiniões de especialistas. São normalmente feitas no código sentimental, complementadas pelas características técnicas que lhe são favoráveis.
Outro dia mesmo, ouvi um comentarista português fazendo críticas à economia brasileira. E logo me veio à mente: “Olha quem fala, veja como está Portugal”. Repare na insanidade desse meu pensamento. A situação lusa em nada justifica, minimiza ou contradiz o que ele dizia, no modo “perito econômico”, sobre as finanças brasileiras. Somos um país em desenvolvimento e temos muito a fazer ainda.
Acontece que estar disposto a mudar a chave não é tarefa simples ou, arrisco dizer (sem me preocupar com a gramática), humanamente predisposta. Digo isso porque, nessas horas eleitorais, as redes sociais têm sido inundadas com cartazes, “memes”, capas de revistas, matérias de jornais, caricaturas... E seguem-se comentários