Sobre a cera dos corpos femininos, o século XXI vai imprimindo suas primeiras marcas. Produto social, produto cultural e histórico, nossa sociedade os fragmentou e recompôs, regulando seus usos, normas e funções. Nos últimos cem anos, a mulher brasileira viveu diversas transformações físicas. Viu ser introduzida a higiene corporal, que alimentada pela revolução microbiológica, transformou-se numa radicalização compulsiva e ansiosa. Acompanhou a invenção do batom, em 1925, do desodorante, nos anos 50, cortou os cabelos à la garçonne, gesto sacrílego contra vastas cabeleiras do século passado. O aprofundamento dos decotes levou-a a aderir à depilação. O espartilho, graças ao trabalho feminino nas fábricas, diminuiu e se transformou em soutien para possibilitar uma maior movimentação dos braços. Manter a linha tornou-se um culto. A magreza ativa foi a resposta do século à gordura passiva da belle époque. O jeans colado e a minissaia sucederam, nos anos 60, ao erotismo da mão na luva e das saias no meio dos tornozelos característicos dos anos 20. Com o desaparecimento da luva, essa capa sensual que funcionava ao mesmo tempo como freio e estímulo do desejo, surgiu o esmalte de unhas. A ideia é a de que a história das mulheres passa pela história de seus corpos. Sexo belo ou sexo frágil, tais denominações vinculam-se às imagens que nossa sociedade fez deles, de sua sensualidade, beleza ou de sua saúde. No passado, o corpo da mulher, como veremos adiante, era visto com as marcas da exclusão e da inferioridade. Cristalizada pelas formas de pensar de uma sociedade masculina, a evocação das imagens do corpo e da identidade feminina, na pluma de diferentes autores, apenas refletia subordinação. Um exemplo? Segundo os médicos setecentistas, ele era menor, seus ossos pequenos, suas carnes moles e esponjosas, seu caráter, débil. Sua subordinação expressava-se, ainda, na capacidade de reproduzir, quando solicitada pelos homens. Contudo, na outra ponta desta submissão, a mulher