Auto
A peça "Auto da Compadecida", escrita por Ariano Suassuna em 1955, obteve grande destaque ao ser encenada no Rio de Janeiro, em 1957, por ocasião do 1º Festival de Amadores Nacionais. O Brasil descobria ali um novo tipo de teatro, calcado na tradição popular.
O enredo da peça é um trabalho de montagem e moldagem baseado em uma tradição antiquíssima, que remonta aos autos medievais de Gil Vicente e mais diretamente a inúmeros autores populares que se dedicaram ao gênero do cordel. Nesse tipo de literatura, os criadores contam e recontam as mesmas histórias e acrescentam o seu toque pessoal. Reconhecer esse “toque pessoal” de cada trabalho artesanal, contudo, exige do observador grande atenção aos detalhes.
A peça tem um pequeno texto introdutório que visa a orientar a encenação e a explicar, em linhas gerais, o espírito da obra: “O Auto da Compadecida foi escrito com base em romances e histórias populares do Nordeste. Sua encenação deve seguir, portanto, a maior linha de simplicidade, dentro do espírito em que foi concebido e realizado (...)”.
Um pouco adiante, o autor sugere ainda que na primeira cena se utilize o palco como um “picadeiro de circo”. De fato, nessa cena, todos os personagens (com exceção de Manuel, o Jesus, representado por um ator negro, que fica escondido para preservar o efeito de surpresa) apresentam-se ao público fazendo mesuras e são anunciados em voz alta pelo Palhaço, numa atmosfera circense.
A primeira fala da peça cabe ao Palhaço, e a orientação do autor é que seja realizada em “grande voz”: “Auto da Compadecida! O julgamento de alguns canalhas, entre os quais um sacristão, um padre e um bispo (...)”.
Após um “toque de clarim”, o assunto da peça é anunciado pelo Palhaço: “A intervenção de Nossa Senhora no momento propício, para triunfo da misericórdia. Auto da Compadecida!”
Todos esses elementos antecipam partes da narrativa: desde a apresentação prévia dos personagens até o anúncio de que será