Auto da barca do inferno
Gil Vicente
BD
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Digital
Colecção
CLÁSSICOS
DA LITERATURA
PORTUGUESA
Auto da Barca do Inferno Gil Vicente
pág.
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Introdução
T
exto fixado de acordo com a edição prínceps de cerca de 1518, onde é intitulado Auto de Moralidade.
INTRODUÇÃO DE GIL VICENTE
Auto de Moralidade composto por Gil Vicente per contemplação da sereníssima e muito católica rainha dona Lianor, nossa senhora, e representado per seu mandado ao poderoso príncipe e mui alto rei dom Manuel, primeiro de Portugal deste nome.
Começa a declaração e argumento da obra. Primeiramente, no presente auto, se fegura que, no ponto que acabamos de espirar, chegamos supitamente a um rio, o qual per força havemos de passar em um de dous batés que naquele porto estão, scilicet, um deles passa pera o Paraíso, e o outro pera o Inferno; os quais batés tem cada um seus arrais na proa: o do Paraíso um Anjo, e o do Inferno um Arrais infernal e um Companheiro.
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Cena I
O primeiro entrelocutor é um Fidalgo que chega com um Paje que lhe leva um rabo mui comprido e u a cadeira d’espaldas. E
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começa o Arrais do Inferno ante que o Fidalgo venha.
DIABO
COMPANHEIRO
DIABO
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COMPANHEIRO
DIABO
À barca, à barca, houlá! que temos gentil maré!
– Ora venha o caro à ré!
Feito, feito!
Bem está!
Vai tu muitieramá, atesa aquele palanco e despeja aquele banco pera a gente que vinrá.
À barca, à barca, hu-u!
Asinha, que se quer ir!
Oh! Que tempo de partir, louvores a Berzebu!
– Ora, sus! Que fazes tu?
Despeja todo esse leito!
Em boa hora! Feito, feito!
Abaxa má-hora esse cu!
Faze aquela poja lesta
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COMPANHEIRO
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e alija aquela