ARROJOS
Cesário Verde
"Arrojos" foi publicado em conjunto com dois outros poemas sob o antetítulo comum "Fantasias do Impossível".
Os dois primeiros versos de cada uma das quadras do poema constituem a apresentação de uma fantasia de uma paixão feliz, paixão que nunca se tornará realidade (o carácter hipotético dessa paixão é realçado pelo emprego das orações condicionais). O antetítulo "Fantasias do impossível" remete precisamente para a impossibilidade de concretização dessa paixão.
A figura feminina apresenta os seguintes traços caracterizadores:
- olhar cortante (glacial): "olhos que ferem como espadas" (v. 2);
- mãos pequenas e graciosas: "mãos mignonnes" (v.6);
- amada inacessível : "a Laura" (v. 17);
- influência perversa sobre o sujeito poético: "a Laura dos meus loucos desvarios" (v. 17);
- arrogância e vaidade: "soberba" (v. 18);
- insensibilidade e indiferença: "fria" (v. 18);
- distância e irrealidade: "aquela visão da fantasia" (v. 29);
- pele muito branca (e macia): "peito alvo como arminho" (v. 30).
A hipérbole presente nos versos: "Eu com um sopro enorme, um sopro imenso / Apagaria o lume das estrelas." (vv. 7-8) sublinha a intensidade da paixão (tão grande que "Apagaria o lume das estrelas"), bem como representa a força da paixão feliz capaz de conferir poderes sobre-humanos, que permitiriam ao sujeito poético dominar as forças da natureza.
Os dois últimos versos revelam a amarga ironia do sujeito poético, uma vez que, tendo consciência de que esta paixão é impossível de realizar, o sujeito lírico afirma que estaria disposto a abandonar o seu hábito quotidiano de ir ao café, se o seu amor fosse correspondido. A ironia também nasce de algo paradoxal: comparar uma grande paixão com uma circunstância do quotidiano, o ir ao café.
Há uma relação de claro desequilíbrio entre o sujeito poético e a amada. Enquanto o sujeito lírico a ama e idolatra, está disposto a por ela conquistar o mar, as estrelas, os relâmpagos, o azul do céu, o sol, os rios,