Análise do poema "Satélite" de Manuel Bandeira
São Paulo
2014
Satélite
Fim de tarde.
No céu plúmbeo
A lua baça
Paira.
Muito cosmograficamente
Satélite.
Desmetaforizada,
Desmitificada,
Despojada do velho segredo de melancolia,
Não é agora o golfão de cismas,
O astro dos loucos e enamorados,
Mas tão somente
Satélite.
Ah! Lua deste fim de tarde,
Desmissionária de atribuições românticas;
Sem show para as disponibilidades sentimentais!
Fatigado de mais-valia, gosto de ti, assim:
Coisa em si,
-Satélite.
ANÁLISE
“Satélite”, de Manuel Bandeira, foi publicado no livro Estrela da Tarde, de 1960.
O poema exibe os traços característicos do pós-modernismo, somados aos traços da obra de Bandeira, neste ponto já com mais de 70 anos de idade. A preocupação com a forma é quase inexistente: os versos não seguem uma metrificação, não há uma forma fixa e até a rima é praticamente nula – o praticamente é porque quando o tal satélite aparece, ele normalmente vem acompanhado de uma sugestão de rima através das últimas sílabas “te”, como vê-se nos trechos a seguir:
“...
Muito cosmograficamente
Satélite.
...
Mas tão somente
Satélite.”
Esta ausência de formalidade do poema não é, portanto, restritiva.
Foneticamente, é possível também notar que o poeta utiliza alguns artifícios discretos: o céu plúmbeo, cheio de vogais fechadas, contrasta com a lua baça que paira, com vogais abertas. O fonema /s/ aparece repetidamente também, seja em palavras como o próprio satélite, seja nos plurais, ou mesmo nas palavras como “disponibilidades”. Na última estrofe, ocorre mais uma quase rima: “Fatigado de mais-valia, gosto de ti, assim:
Coisa em si,
-Satélite.”
Com “ti” e “satélite” e “assim” e “si” se aproximando.
Também não há uma estrutura específica no poema, que se divide em quatro estrofes totalmente assimétricas. No início da segunda estrofe ocorre a aliteração do prefixo “des”, que relaciona-se de maneira direta com a natureza
do