animais
Alforria, direito e direitos no Brasil e nos Estados Unidos
Keila Grinberg
Muito já se discutiu sobre o papel da legislação na definição do caráter dos regimes escravistas nas Américas. A questão foi inicialmente formulada por Frank Tannenbaum, em seu clássico Slave and citizen, no qual enfatizou o que seriam, para ele, as diferenças fundamentais entre a escravidão nos Estados Unidos e na América Latina. Publicado pouco depois do fim da
Segunda Guerra Mundial, nesse livro o autor busca explicar, através da análise comparada, as causas do assim chamado “American Problem”, da forma como era considerado por boa parte dos intelectuais norte-americanos de então: o estado das relações raciais nos Estados Unidos. À época, baseado na leitura da realidade brasileir a de Gilberto Freyre, ele defendeu que a aceitação da personalidade moral do escravo teria sido um fator fundamental na definição da forma da abolição da escravidão. Como na América Latina o escravo era reconhecido efetivamente como pessoa, a escravidão teria acabado de forma pacífica, ao passo que no Sul dos Estados Unidos, como o cativo não passava, juridicamente, de coisa, o fim da escravidão só teria sido arrancado à força. 1 Para fundamentar suas idéias, Tannenbaum (1946) argumenta que a chave para a compreensão dos distintos processos estaria no papel da religião e da lei nos regimes escravistas da América Latina, sujeitos à jurisdição da Igreja Católica e à influência da legislação ibérica.
Tannenbaum possui o mérito de ter motivado inúmeros historiadores a se debruçar sobre o estudo comparado da escravidão nas Américas. A partir de sua obra, não foram poucas as análises comparativas que se dedicaram ao tema, confirmando ou refutando suas afirmações. As posições historiográficas dividem- se basicamente entre aqueles, como Elkins, que concordaram no fato de a cultura e as instituições latino-americanas terem contribuído para a produção de um regime escravista moderado,