Algo em troca
Estou tentando ser mais discreta o possível pois uma vez já pegaram-me espiando e a reação não foi nada agradável. Talvez seja porque tantas pessoas os olham e não fazem nada que acabam deixando-os irritados. Talvez. Mas queria descobrir o porquê.
Maria já tinha ido embora. Tenho quarenta minutos até meus pais chegarem do serviço. Que tipo de abordagem devo fazer? "Ei, vocês, o que fazem aqui no frio?", não, muito direta. "Com licença, o que estariam fazendo aqui nesse ambiente com falat de calor?", também não, muito formal. Na hora eu saberei o que falar.
A medida que me aproximo os olhares estranhos aumentam. Normalmente, qualquer criança já teria fugido ou se assustado. Mas eu não. Não sei muito bem o que me fez vir até aqui, só sei que vim.
Haviam dois deles, ninguém falava nada até que perguntei o que faziam ali. Demorou para que eles falassem, mas quando consegui desejei nunca ter perguntado. Nunca achei que aquilo poderia acontecer com alguma pessoa. O máximo que eu pode fazer foi levá-los comida e água.
Naquela noite, minha mãe perguntou-me o que eu queria ser quando crescesse. Respondi que queria cuidar de pessoas rua. Ela simplesmente revirou os olhos e disse "Por que cuidar de alguém que nunca vai te fazer algo em troca?".