Adorno Posição do narrador
Schelling,7 seguem o mesmo caminho. Não que os poemas épicos tenham sido ditados pela intenção alegórica. Mas o poder da tendência histórica sobre a linguagem e o assunto é neles tão grande, que, ao longo das relações entre subjetividade e mitologia, os homens e as coisas se transformaram, em virtude da cegueira com a qual a épica entrega-se à exposição, em meros cenários, nos quais aquela tendência histórica torna-se visível, justamente onde o contexto pragmático e lingüístico mostra-se frágil. "Não são indivíduos, mas idéias que lutam entre si", diz um fragmento de Nietzsche sobre a "questão homérica".8 A conversão objetiva da pura exposição, alheia ao significado, em alegoria objetiva é o que se manifesta tanto na desintegração lógica da linguagem épica quanto no descolamento da metáfora em meio ao curso da ação literal. Só quando abandona o sentido o discurso épico se assemelha à imagem, a uma figura do sentido objetivo, que emerge da negação do sentido subjetivamente racional.
7
Cf. Schelling, Werke, vaI. 2, Leipzig, 1907, p. 302 ["Sistema do idealis-
mo transcendental"]. A propósito, Schelling mais tarde recusou expressamente, na Filosofia da arte, a i~terpretação alegórica de Homero.
8
Nietzsche, Werke, vol. 9, p. 287.
Posição do narrador no romance contemporâneo
A tarefa de resumir em poucos minutos algo sobre a situação atual do romance, enquanto forma, obriga a destacar um de seus momentos, ainda que isso seja uma violência. O momento destacado será o da posição do narrado r. Ela se caracteriza, hoje, por um paradoxo: não se pode mais narrar, embora a forma do romance exija a narração. O romance foi a forma literária específica da era burguesa. Em seu início encontra-se a experiência do mundo desencantado no Dom Quixote, e a capacidade de dominar artisticamente a mera existência continuou sendo o