aborto
O aborto é um caso típico onde as posições quanto ao fundamento ético são inconciliáveis. Para alguns se trata do direito à vida, para outros é evidente que envolve o direito da mulher ao seu próprio corpo e há, ainda, os que estão convencidos de que a malformação grave deve ser eliminada a qualquer preço porque a sociedade tem o direito de ser constituída por indivíduos capazes. Tais posições são características da sociedade judaico-cristã no fim do século XX. Todavia elas não definem todas as culturas em todas as épocas da história humana.
Assim, o aborto é tema da legislação babilônica e hebraica enquanto um delito contra a propriedade era prática comum no mundo greco-romano. Dada a irredutibilidade das posições valorativas sobre a prática do aborto voluntário, os textos internacionais destinados à proteção do direito à vida, em geral, se abstêm de tomar posição sobre o tema.
O hodierno predomínio da cultura cristã, porém, fez com que a Convenção Americana relativa aos Direitos do Homem (assinada em San Jose da Costa Rica, em 1969) reafirmasse a obrigação de os Estados respeitarem a vida de todas as pessoas, proteger esse direito pela lei, "em geral a partir da concepção" (art. 4°).
De outra parte, tradicionalmente a deontologia profissional dos médicos - e, por decorrência, dos demais profissionais da área sanitária - se opôs ao aborto provocado. Hipócrates, nos séculos quinto e quarto antes da era cristã, jurava não dar a "nenhuma mulher um dispositivo abortivo". E, contemporaneamente, tanto o juramento médico (cuja fórmula foi definida em Genebra em 1948) como o Código de Ética Médica, de 1949, afirmam o dever médico de respeito absoluto à vida humana desde a concepção e de conservar a vida humana da concepção até a morte, respectivamente.
Entretanto, nessa matéria nem mesmo os médicos estão imunes ao conflito dos valores fundamentais, pois, na medida em que não existe um critério comum à humanidade, as