Minha vida
José Henrique Bortoluci[2]
O pensamento social brasileiro, no que tem de mais essencial, gravita em torno do problema da constituição da modernidade entre nós. Desde um Tavares Bastos até a mais recente produção acadêmica, nossos diversos “intérpretes” (se é que esse termo possa ser usado para toda essa produção, sem as devidas ressalvas) esforçaram-se, acima de tudo, para fazer sentido sobre a constituição da modernidade em uma sociedade tão notavelmente “não-clássica” como a nossa. Como nos lembraria Sérgio Buarque de Holanda, somos uma nação que já nasce marcada por uma dificílima empreitada: “A tentativa de implantação da cultura européia em extenso território, dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar é, nas origens da sociedade brasileira, o fato dominante e mais rico de conseqüências” (Holanda, p. 31). Logo à frente, Sérgio Buarque já levanta um condicionante que traria ainda mais dificuldades ao quadro geral: aquela tentativa de implantação de uma cultura européia teria como realizadores, em nossas terras, uma nação das “menos européias” do Velho Continente: teríamos recebido nossa herança de uma nação ibérica (Holanda, p. 31). Esse fato é igualmente central para um outro grande intérprete, como Raymundo Faoro: a sua clássica análise sobre o estamento burocrático brasileiro (os verdadeiros “donos do poder” em nossa sociedade) inicia-se com uma abordagem sobre as origens do estado português, estado em que, diferentemente do que teria se dado com seus “clássicos” congêneres europeus, “o feudalismo cedeu lugar, ainda mal assentado, a poder maior, centralizador e de natureza militar” (Faoro, 1958, p. 3). Na verdade, a questão sobre a constituição de nossa modernidade se desdobrou em diversas outras, mobilizadas conforme as diferentes posturas analíticas de nossos intérpretes. Três desses