fernannda
Mas o que é este retrato de nós mesmos, quando estamos sozinhos? Quando estamos com desconhecidos jokj _ Pousava os pés num degrau dos apenas três da pequena escada que havia entre a varanda e o jardim, entre sua casa e o restante do mundo, que se estendia sem se dar conta. Suas mãos iam à cintura, às cinco da tarde, já todo serviço estava feito. Seu corpo arrastara-se de avental pela casa toda manhã; depois era fazer com o próprio corpo um buraco de abrigo para o filho que, a esta hora, fica no quarto. Agora era o sol se pôr, por entre os galhos que faziam a tosca porteira até as ramagens, de onde não se via, e nem chegaria ninguém. Era a porta bater e voltar (pela falta de trinco), o vento trazendo a poeira, as nuvens sombreando a alameda. Fico sentada diante da mesa, mergulhada num barulho de tempestade que insiste do outro lado da porta; num silêncio de coisas que vez por outra nos acometem. E sinto aquele antigo impulso, o de ser lançado, inevitavelmente, na multidão das vozes. Apenas para ser quem escuta conversas vindas da cozinha, que não me dizem respeito e não me exigem resposta. A umidade desta tarde nos emudece junto, retira qualquer esforço para erguer a voz. Fico insalubre e sufocante, tenho impulsos de chorar. E então sinto minha fraqueza, algo obscura, como os charcos cobertos pelo nevoeiro, como o relógio tiquetaqueando na gaveta (por que tenho o costume de escondê-lo).